É com pena que vejo este filme passar ao lado de Portugal.
É com pena que vejo que um filme como o Pátio das Cantigas eclipsa uma obra-prima do cinema português (o tempo tratará de dar o devido reconhecimento à omelete que Miguel Gomes conseguiu fazer sem ovos) como o Mil e Um Noites. Não se trata de menosprezar a galinha de ovos de ouro que Leonel Vieira descobriu - só o vê quem quer, só apoia o cinema baseado na reciclagem de titulos centenários quem quer. Aliás, a ideia é tão vencedora que se vai replicar em mais meia-dúzia de obras para encher a barriga de quem gostou da fórmula inicial.
O que mais me custa é que 8 em cada 10 portugueses (isto é uma estatística totalmente aleatória, baseada num censos feito por mim a pessoas que encontrei por aí) olharão para o título Mil e Uma Noites, para as 6 horas de filme e para o nome de Miguel Gomes e acabarão por desistir com a justificação, clássica, de se tratar de uma coisa para intelectuais.
Meus caros - estão redondamente enganados.
Que se recusem a ver o Tabu até aceito (embora o faça com pena de quem não se digna a ler a sinopse ou a aguentar os dois minutos dotrailer que estão no youtube) - é um filme a preto e branco, sobre o tempo colonial "e isso já não interessa". Mas em Mil e Uma Noites aquilo que vemos é um esforço nobre, valente e ousado de gritar aos sete ventos aquilo em que nos transformaram, aquilo em que nos deixámos transformar - o canto esquecido em que acabámos. Composto por um conjunto de quatro histórias bem-dispostas, que nos forçam a encarar com um sorriso as agruras do presente, as duas horas de O Inquieto, a primeira parte de Mil e Uma Noites, convencem o público a regressar - Dia 24 de Setembro estreará O Desolado e a 1 de Outubro a trilogia encerra-se com O Encantado.
Vão vê-lo, por favor. Porque é nosso, é sobre nós e está muito bem feito.
Tudo começa com um cinquentão Tom Cruise agarrado a um avião. Só para deixar bem claro que ele não está aqui para brincadeiras - a saga de Missão Impossível está mais viva do que nunca e, ao quinto filme, Tom Cruise continua a dar tudo quando veste a pele de Ethan Hunt. É verdade que Tom Cruise é um dos melhores piores actores de Hollywood, é verdade que o filme carimba todos os estereótipos de Hollywood, é verdade que no final o bom vence o mau, é verdade que aqui é sempre tudo à grande.
Mas, fuck it, foi para isto que Missão Impossível apareceu. Nasceu para ensinar a todos os outros como se faz e, felizmente, depois de engasgar no segundo e terceiro filmes, reentrou nos eixos no filme de 2011 e chega a 2015 melhor do que nunca. Se não for adepto, não vale a pena forçar - vai encontrar mil e uma justificações para não gostar (que eu, pessoalmente, vou achar absurdas). Se gostar de Ethan Hunt tanto quanto eu, então vai adorar - Rogue Nation é Missão Impossível do mais brutal que já foi feito, do primeiro ao último minuto.
Fui, provavelmente, o último aficionado de histórias com pancada a ver os dois filmes que Gareth Evans conseguiu fazer com a meia dúzia de trocos que tinham ficado esquecidos no bolso de trás das calças. Pronto, no caso do segundo filme não foi exactamente assim, muito à custa do sucesso do primeiro. Vamos por partes.
Em The Raid: Redemption, filme lançado em 2011, Rama é um policia novato que entra num edifício decrépito e infernal, onde o submundo da droga distorceu há muito as mais nobres regras sociais e regressou à primordial lei do mais forte. Na segunda parte desta história, estreada em 2014, (The Raid 2: Berandal), Gareth Evans utilizou com astúcia um orçamento mais recheado e conseguiu que, a sua sequela, superasse a qualidade do seu primeiro filme (coisa rara em cinema). Com uma longa metragem mais musculada, ambiciosa e complexa, Rama volta a ser o protagonista de uma missão (quase) impossível, um hitman disposto a tudo para desmantelar um cartel que controla a distribuição da droga nas ruas de Jacarta.
Porque vale a pena ver The Raid? Porque, infelizmente, não é todos os dias que um filme de acção consegue ser mais do que meia dúzia de calmeirões a distribuir fruta. Gareth Evans escreve não só um argumento inteligente, como complementa a sua história com cenas de ação muito bem trabalhadas, conseguindo um equilibrio sempre dificil entre aquilo que é essencial para adornar o espetáculo da acção, com aquilo que é perfeitamente gratuito e dispensável. Definitivamente Evans sabe aquilo que está a fazer. Em 2018 deverá chegar o terceiro filme da saga.
Limitations often inspire filmmakers to storytellers to make better work, but sometimes those limitations can be so suffocating they destroy a project and often damage the soul of the artist. Instead of allowing his spirit to be crushed and giving up, instead of allowing himself to be filled with anger and frustration, Jafar Panahicreated a love letter to cinema. His film is filled with love for his art, his community, his country and his audience
Não sou adepto de filmes de animação. O último que vi foi o Wall-E sei lá há quantos anos. Mas o cartaz de cinema está uma bosta e até Outubro tudo o que vem à rede é peixe.
Então lá me meti na sala de cinema para ver a versão original de Inside Out. Assim que a Amy Poehler começou a falar senti que as coisas podiam correr bem. E o argumento do filme é realmente vencedor, tanto para miúdos como para graúdos. Enquanto simplifica coisas tão naturais como os sentimentos ou as reações infantis, constrói um poderoso e complexo universo de pequenas criaturas, cada uma com o seu caderno de encargos sentimentais, que habitam no centro sistema nervoso das personagens.
Neste pequeno (grande) filme de bonecada há de tudo. Desde o mais primário dos sentimentos (o amor incondicional que nasce com uma criança) até às reações explosivas do principio da adolescência. E passa pela guerra dos sexos enquanto o desafia esterótipos. Tudo isto sem esquecer, claro, a qualidade técnica do filme - será que algum dia a Pixar vai parar de melhorar?
Logo, não queiramos fazer deste filme aquilo que ele nunca quis ser. A malta que se senta na sala de cinema não se pode admirar que no final o Chris Pratt só tenha 2 arranhões. Não se pode chatear com o facto da Bryce Dallas Howard correr a 20km/h com sapatos altos pelo meio de terra molhada sem destruir os tornozelos. Não se pode sentir roubado no preço do bilhete quando a Bryce Dallas Howard não sabe a idade dos sobrinhos mas reconhece o casaco sujo de um dos garotos no meio da selva. Não se pode indignar quando os Raptors se deixam levar na conversa do Chris Pratt (afinal não são só as mulheres!).
É um filme de dinossauros e a malta vai lá é para ver os dinossauros, com todos os clichés agarrados (desde o galã super-herói que fica com a jovem do decote transpirado, passando pelos comentários desnecessários de alguém demasiado empolgado na cadeira do lado, até aos maus da fita que acabam inevitavelmente a serem comidos por dinossauros). Não vale a pena procurar respostas, ensaiar argumentos ou remar contra a maré. Não vão chegar a lado nenhum. Jurassic World cumpre aquilo a que se propôs. E era isso que os garotos que se assustaram na década de 90 com o primeiro Jurassic Park queriam.
Como se tivesse corrido sem parar durante duas horas.
É este o patamar para onde George Miller nos catapulta. Catapultar: é uma boa forma de explicar o verdadeiro roller coaster em que nos metemos quando decidimos entrar na sala de cinema para ver Mad Max. Está aqui um belo pedaço de arte. Conseguir que um filme acelere até aos 100km/hora em menos de 2 minutos para aí se manter durante os 118 minutos que se seguem é uma façanha que merece o respeito do público. Ver Mad Max é como entrar num pesadelo muito muito muito sombrio, estar sufocado num mundo onde o caos se instalou, onde a gestão dos recursos naturais comanda as milícias fortemente armadas e onde os misfits pagam com a vida a impertinência da sua coragem. E pagamos com emoção, suor e desconforto todo o suspense que Mad Max tem para nos oferecer. A cadeira é um espaço demasiado constrangedor, que limita o nosso entusiasmo.
Merecia ser visto no ecrã gigante de um estádio de futebol, de pé, com várias cervejas na mão. Até porque pelo meio mete um Tom Hardy e um Nicholas Hoult a darem tudo.
É bom quando não se complica aquilo que tem tudo para correr bem. E um filme com Martin Luther King, sobre as suas causas, que reconstrói um momento importante da sua longa e fatal caminhada, tem os ingredientes necessários para começar com o pé direito. Se o embalarmos com um groove muito característico do soul americano, continuamos no caminho certo.
Mas só isso não chega.
Precisamos de um actor à altura de um personagem tão nobre e carismático como o foi Martin Luther King. E David Oyelowo cumpriu com aquilo que lhe era exigido. Precisamos de trabalhar o argumento e torná-lo apetecível ao ponto de um obstáculo, no meio da longa caminhada pela igualdade dos direitos dos americanos de raça negra, fosse mais do que uma mera ponte. E a caneta de Paul Webb encontrou a câmara de Ava DuVernay para juntos darem forma a Selma. Um episódio incrível da luta dos negros e dos brancos que viram para lá da densa cortina do racismo. Que tiveram forças para ultrapassar barreiras nunca antes importunadas. Selma é uma bonita homenagem aos mais corajosos.
Isto não é a última coca-cola do deserto. O argumento não é novo. Não vai ser o filme das vossas vidas. MAS. A verdade é que Kingsman é um filme bem disposto, daqueles humildes e despretensiosos pedaços de arte que nasceu para ser visto com um saco de pipocas e um copo de refrigerante.
É de filmes destes que (também) se faz a vida de um amante do cinema. Há cenas em Kingsman absolutamente hilariantes, de "levantar o estádio", em que a câmara não pára. Em boa verdade, é relativamente fácil apresentar meia duzia de (válidos) argumentos para criticar, rebaixar e humilhar Kingsman. Não tem a profundidade, não tem o rasgo, não tem a prosa. Basta ter nascido na década de 70-80 e ter papado tudo o que já se fez de filmes pós-apocalíticos/super-heróis/mentes-brilhantes/garotos-predestinados, um pouco de comichão no nariz e uma má digestão para se deitar fora este super bem disposto Kingsman.
História simples. Serviços secretos, garoto da classe baixa órfão de pai, plano para destruir a humanidade, Samuel L. Jackson como vilão, Colin Firth como gentleman, Taron Egerton como futuro sex symbol inglês. Agora só falta um pouco de boa vontade e um serão sem grandes preocupações. O resto Kingsman faz.