Saltar para: Posts [1], Pesquisa [2]

DIAL P FOR POPCORN

DIAL P FOR POPCORN

THE WIRE é especial


THE WIRE, 
 ou como o conceito de televisão é obtuso demais para certas séries


THE WIRE, considerado justamente como um dos melhores dramas de sempre, é muito mais que um simples drama televisivo com a chancela da HBO (desde logo, óbvio selo de excelência). Foi esta série que redefiniu, para mim, o que quer dizer o termo “melhor série de todos os tempos”. “Realista” é um termo demasiado lato para definir a excelência desta série – mais vezes parecida com um produto documental que uma série televisiva, THE WIRE segue de forma fiel e crua os intervenientes do tráfico de droga e da brigada policial de combate às drogas, contando as suas histórias e mostrando a sua vida e o seu dia-a-dia e, através disso, tece um comentário genuíno, sincero e crítico sobre a tempestuosa relação entre os diferentes círculos sociais de Baltimore, em especial a complicada convivência entre negros e brancos, não se coibindo de opinar sobre a política citadina ou a influência dos media na sociedade contemporânea. 


Uma série, portanto, que ultrapassa largamente o confinado conceito de televisão que ainda hoje preenche as grelhas de todos os canais generalistas americanos – e mesmo os de cabo, capaz de provocar além de entreter, de nos levar a pensar sem nos dar a resposta logo de seguida. Em termos de “melhores de sempre”, só encontra os seus pares em “Mad Men”, “The Sopranos”, “Six Feet Under” e “Breaking Bad”. E mesmo estes, em minha opinião, não chegam perto das aspirações que “The Wire” se propõe atingir.

 
Style in The Wire from Erlend Lavik on Vimeo.

McNulty. Stringer Bell. Omar Little. Bunk. Avon. Com personagens genuínas e honestas e complexas, independentemente do seu género, raça ou classe social, e uma facilidade brilhante em humanizar e apagar a linha ténue que existe entre o bem e o mal, fazendo-nos muitas vezes sentir e emocionar-nos com personagens capazes de actos imensamente cruéis, THE WIRE nunca nos pede para julgar, ajudando-nos a compreender que no fundo ambos os lados têm mais em comum do que pensam e que todos têm os seus motivos e ambições e todos procuram viver a sua vida, nas suas próprias circunstâncias, o melhor que conseguem.


McNulty é o perfeito exemplo de uma personagem que teoricamente seria um dos bons que, contudo, é na prática muito mais complicado de entender. Um homem problemático, com uma personalidade difícil, destrutiva e por vezes irracional, que se entrega à bebida e ao prazer instantâneo com múltiplas mulheres. Nenhum outro programa tentou retratar, de forma tão imparcial, autêntica e detalhada o ambiente político-social de uma pacata cidade americana com a grandiosidade, inteligência, reflexão e visão que o diálogo e as personagens de David Simon e Cª o fizeram.

   

THE WIRE nunca teve, ao longo do seu curso, as audiências que a série merecia (é um milagre que tenha sobrevivido cinco temporadas) mas foi ganhando fama de série de culto imediatamente após o seu término. E assim continuará a suceder. Todos os dias, em algum lado, alguém vai pegar em THE WIRE. E irá ficar desde logo encantado pelos fabulosos e intoxicantes créditos de abertura. E vai perceber o nível de genialidade e criatividade de David Simon e o quão profundo e importante é que temas desta dimensão sejam discutidos desta forma na televisão. E acima de tudo vai entender o quão precioso é cada episódio – e só há 60. E certamente que sessenta míseras horas de uma das maiores produções televisivas de sempre é muito pouco, não?

"Before Midnight" de Linklater ganha primeiro trailer


Um dos filmes mais ansiados do ano fez chegar o seu primeiro trailer hoje. O filme que completa a história de Jesse (Ethan Hawke) e Celine (Julie Delpy), "Before Midnight" de Richard Linklater tem estreia marcada em território português no IndieLisboa a 27 de Abril e estreia comercial em Junho. De visualização obrigatória, seja para quem viu o romance surgir pela primeira vez há quinze anos em "Before Sunrise" e desenvolver-se nove anos depois em "Before Sunset", seja para quem nunca viu os dois filmes antecessores (vão vê-los imediatamente!).

 

Porque nunca é demais lembrarmo-nos de IN THE BEDROOM (2001)




Esta crítica, por assim dizer, faz parte da rubrica "O Cinema dos Anos 2000" do Keyzer Soze's Place, na qual participo ao lado de outros porreiríssimos bloggers. Espreitem tudo AQUI. Ao Samuel agradeço o convite, aos bloggers a que me junto agradeço a companhia e, sobretudo, os múltiplos ensinamentos que retiro de cada um dos seus textos.



Através de uma história aparentemente inofensiva, Todd Field cria um drama cruel, onde as revelações são lentas, as emoções turbulentas e não há grande catarse ou final feliz – só feridas abertas, bem vincadas e vidas arrasadas, transformadas de um dia para o outro no seguimento de uma enorme tragédia. Uma tragédia bem familiar e por isso mais temível ainda, que poderia acontecer a qualquer um de nós. Uma situação tão confrontante, que catalisa e impulsiona o filme, mexendo com ele de forma bela e complexa, que transparece o ecrã e nos faz também nós sentir a mudança. Uma mudança permanente, definitiva. 


IN THE BEDROOM fala de amor e saudade, de luto e remorso, de ódio, rancor e vingança. No fundo, o filme fala sobre sobrevivência. Não de um ponto de vista primitivo, real, mas sim em relação à forma de estar no mundo, como se a vida destas personagens dependesse disso, da necessidade em voltar a um normal que conheciam anteriormente e ao qual não há ponto de retorno. Esta é a história deste casal, de Matt e Ruth e da penosa e dolorosa adaptação que a sua relação e o seu mundo vão ter que sofrer. Duas brilhantes interpretações de Sissy Spacek e Tom Wilkinson, que connosco partilham tudo o que sentem e pensam. Emoções tão profundas e internalizadas e ao mesmo tempo tão facilmente acessíveis, mal escondidas por debaixo da superfície aparentemente estoica e firme, duas personagens imperfeitas e reais, gente boa, trabalhadora e gentil, simplesmente a viver a sua vida dia após dia. 


Um dos dramas mais fascinantes do início do século XXI e seguramente um dos melhores da década, IN THE BEDROOM reúne todas as qualidades do cinema independente norte americano – excelente elenco, com muitos actores talentosos subaproveitados pela indústria (como a fabulosa Marisa Tomei), bons valores de produção e um argumento desafiador, fugindo às fórmulas convencionais, tudo a baixo custo – e tem em Field um timoneiro com uma seriedade e certeza pouco comuns num realizador-argumentista à frente do seu primeiro filme. Um caso sério de sucesso, confirmado pela aclamação crítica, pela receita de bilheteira surpreendentemente estrondosa (36 milhões de lucro só nos Estados Unidos da América!) e as cinco nomeações aos Óscares, de visualização obrigatória.


*Uma adenda ao texto: sim, eu teria votado nos três actores (Spacek, Wilkinson, Tomei) nos Óscares. São enormes, cada um deles. E a Sissy Spacek come o cenário, a tela, tudo. Genial.

Ninho de Cucos (IX)

Como amante do cinema não podia estar mais contente por esta zaragata toda dos Óscares estar finalmente a assentar. Aquilo que me faz gostar de cinema é poder ver uma bela obra de arte quando o acaso mo permite e a vontade o deseja, não a necessidade imperiosa e urgente que o último filme da Universal ou da Paramount faz surgir nos pobres de nós que se deixam viciar pela indústria sediada nas colinas californianas. Mas esqueçamos essa efeméride, cuja esfera gravitacional de interesse suga até as palavras do cronista que a tenta infrutiferamente evitar. 

Em vez disso encaremos a 7ª arte pela perspectiva do covarde que evita qualquer confronto com o novo, na ânsia de assim poder evitar toda a aberração artística que, por meio de boa propaganda, consegue colocar-se nas bocas do mundo. Não se pode dizer que esse covarde seja uma fabricação artificial de um receio que não tem razão de existir, mas como o hipocondríaco que desorientado pela evolução médico-farmacêutica se acha portador de toda a maleita, é também o nosso atarantado cinéfilo um produto da radiação massiva a que a indústria cinematográfica o expõe. E não é falso que não hajam motivos para esta fobia: televisão, revistas, jornais, paragens de autocarros, etc. nada é deixado incólume pelos Donald Drapers do mundo ocidental, e verdade seja dita, é um trabalho incansável o destes senhores, se tivermos em conta que, mesmo no momento em que nos deixamos vencer pela sugestão do reclame e pomos os pés na sala de cinema, somos inundados com ainda mais slogans, trailers e outro arsenal publicitário!


Ainda assim este negócio, sendo por si só uma forma de arte, não deixa de ser em termos práticos uma questão de quantidades e alcances. Longe de ser um entendido na área, acredito que o sucesso de uma campanha depende muito mais da quantidade de vezes que ela é repetida perante o público-alvo do que propriamente da qualidade do seu conteúdo. Toda a gente se lembra de anúncios intemporais como o da Ferrero Roché ou de outras marcas que repetem os seus reclames há anos, mas se pensarem nisso ninguém consegue eleger o(s) melhor(es) anúncio(s) que viu na vida! Podemos pegar no fenómeno musical Justin Bieber e perceber que a reputação não serve de nada quando o alcance atinge semelhante magnitude. Com o cinema acontece o mesmo. Um filme fraquinho e ranhoso que seja produzido pelos grandes estúdios corre o risco de encontrar uma boa agência de publicidade, e ser inclusivamente confundido com um filme tolerável.

É disto que o nosso covarde tem medo. Mas este fictício amigo sabe bem que nem a melhor publicidade do mundo pode fazer um falhanço artístico ter um velório menos precoce, a não ser que se trate de uma daquelas magníficas histórias de fracasso colossal que ficam imortalizadas, que nem fábulas lafontaineanas. A crítica, e sobretudo a ausência dela, separa os trigo do joio e ao fim de algum tempo a consciência cultural do filme passa a ser muito mais fidedigna. E é assim que se constroem os clássicos. Aqueles que, por mais tempo que passe, nunca chegam verdadeiramente a passar de moda!

É óbvio que nem todos podemos ter a mesma opinião acerca de algo tão vago como um filme, porque afinal o cinema é uma arte e como tal tem um filtro de subjectividade associado a ele. Para além do mais a mente humana tem o terrível 'defeito' de não ser monovalente, ou melhor dito nas palavras de Balzac: "cada ideia tem o seu direito e o seu avesso. Tudo é bilateral no domínio do pensamento. As ideias são binárias". E é precisamente por isso que é perfeitamente impossível conseguir-se catalogar cinema por ordem de qualidade. Por mais peritos que se possam juntar, nunca se poderá encontrar um melhor filme de sempre! Da mesma forma, perceber se uma fita recém-lançada nas salas de cinema, poderá pertencer ao panteão dos filmes que glorificam esta arte que tanto prezamos não será concebível sem o período ruminatório que a nossa consciência artística global exige.


Dá a impressão que os receios do covarde até podem ter razão para existir. Mas vendo as coisas de um prisma mais abrangente, facilmente se percebe o quão egoísta e oportunista esta atitude é. Egoísta porque um indivíduo que não se permite a visionar filmes novos por medo da sua mediocridade é um voltar de costas à discussão que a internet, os media, e a blogosfera têm no sentido de trazer uma voz crítica e assim fazer evoluir o mundo do cinema. Oportunista porque se alimenta do trabalho de outros sem ter qualquer papel nessa demanda, da mesma maneira como o Cardozo consegue ser o melhor marcador da última década no Benfica, apesar de ser o homem mais descoordenado da América do Sul.

Contudo ao fim e ao cabo, o indivíduo que fica à espera dos experts para saber qual o melhor filme, corre o risco de ver a sua busca perdida numa opinião falaciosamente ditada por tendências que não correspondem às suas. E voltando ao tema das estatuetas douradas, é perturbador saber que pérolas da história do cinema como Citizen Kane, 12 Angry Men ou A Clockwork Orange nunca tenham sido propriamente distinguidas, e génios incontornáveis como Welles, Kubrick ou Kurosawa tenham sido tão hostilizados pela agremiação que supostamente lidera o mundo do cinema. A Academia é tão conhecida pelos prémios que atribui como pela barbaridade dos erros que comete!


Mas o que fica é a noção de que os inúmeros certames que celebram a arte do cinema funcionam como que guidelines para a comunidade cinéfila. Enquanto que esta atitude possa ser parcialmente justificável, há que manter a imparcialidade na escolha daquilo que vemos e não nos deixarmos assoberbar pela poderosa influência do mundo publicitário, sob pena de se cair no futilidade. Conhecer cinema não é ver um filme do Fellini e dizer que não se gosta do estilo, ou ver um filme taiwanês e resmungar contra o cinema asiático. Hoje em dia já há tanto filme como havia chapéus no tempo do Vasco Santana, mas dá-me a ideia que andamos todos a ir ao cinema no mesmo chapeleiro.

Há que saber ir à loja do fundo da rua perguntar se tem coisas novas!

Gustavo Santos

12 anos depois, Baz volta a abrir Cannes



Há doze anos, "Moulin Rouge!" abria então a secção competitiva do Festival de Cannes de 2001. Depois de críticas mornas, estreou nos Estados Unidos com maior entusiasmo e construiu a sua base de fãs para conquistar oito nomeações aos Óscares, vencendo duas estatuetas.


É bom ver então Baz Luhrmann de volta ao certame francês uma dúzia de anos depois para apresentar o seu novo filme, "The Great Gatsby", que tem incitado grande expectativa (afinal, é a adaptação de uma das maiores obras literárias de sempre pelo realizador mais artístico e criativo do cinema moderno). Temo que o resultado final nunca agradará à crítica especializada que se desloca ao festival, mais dada a cinema de autor e ao triunfo do conteúdo sobre a apresentação - uma fina linha que Luhrmann nunca soube navegar, dado que os seus filmes são sempre melhores espectáculos audiovisuais do que propriamente excelentes narrativas - e "Gatsby" acabará por sofrer, tal qual como sofreu "Australia" (eu bem me lembro de como os críticos desfizeram a película - tudo bem, Luhrmann e a sua megalomania mereceram - e arrumaram com qualquer buzz que pudesse originar). Bem, para já, esperemos pelo melhor. 


Pelo menos, mais não seja, Cannes garante um filme de alto nível de prestígio para abrir o seu festival, com um rol de estrelas de Hollywood - DiCaprio, Mulligan, Maguire, Fisher, Edgerton - para abrilhantar a passadeira vermelha.

Os melhores argumentos de sempre, segundo a WGA



Na semana passada, na ressaca das cerimónias de prémios e passando relativamente despercebida, surgiu a lista actualizada para 2013 dos 101 Melhores Argumentos de Sempre para o Writers' Guild of America (WGA). Recheada de filmes clássicos e escolhas que, na sua maioria, nem merecem sequer discussão quanto à sua inclusão, aqui e ali revela algumas surpresas e algumas opções de nível bastante duvidoso.


"Casablanca", "The Godfather", "Chinatown", "Citizen Kane" e "All About Eve" encabeçam a lista, o que me parece bem, se bem que não seria a ordem pela qual os escolheria. Em #6 vem Woody Allen (considero que "Manhattan" (#54), por exemplo, ou "Hannah and Her Sisters" (#94) são melhores argumentos mas é difícil negar que "Annie Hall" é francamente estupendo também - e é, afinal, o seu Óscar de Melhor Filme). 


Billy Wilder consegue a óbvia distinção de ser a pessoa com mais presenças no topo da lista, com "Sunset Boulevard" (#7) e "Some Like it Hot" (#9) entre os dez primeiros (algo que só Coppola iguala, com os seus dois "The Godfather" - como sempre, é para esquecer que o terceiro existiu - nos primeiros dez lugares).  Porém, custa-me não ver o seu "The Apartment" melhor colocado (#15) - e mesmo "Double Indemnity" (#26). É para mim a comédia mais bem escrita de sempre, ao lado de "It Happened One Night" (#59; também merecia mais). De qualquer forma, é caso para dizer: demasiada coisa boa.

Entre outras boas surpresas, ressalvo a altíssima colocação de Quentin Tarantino (#16, "Pulp Fiction") e dos irmãos Coen (#32 e pelo filme certo, "Fargo") e a inclusão de "Tootsie" (#17), "E.T." (#67), "Shakespeare in Love" (#28), "Groundhog Day"  (#27), "Eternal Sunshine of the Spotless Mind" (#24), "Moonstruck" (#62), "Jaws" (#63), "Back to the Future" (#56) e "When Harry Met Sally" (#40) que não são filmes que uma pessoa pensaria à partida incluir entre estes clássicos. 


De aplaudir também não se terem esquecido - pese a carreira posterior dos seus argumentistas - de McQuarrie (#35, "The Usual Suspects"), Darabont (#22, "Shawshank Redemption"), Ball (#38, "American Beauty"), Shyamalan (#50; apesar de todos os meus problemas com ele, "The Sixth Sense" continua a ser excelente), Crowe (#66, "Jerry Maguire") e Hanson (#60, "LA Confidential"), entre outros.

M. Night Shyamalan elogiado no DPFP? Não posso!

Entre as desilusões, não percebo que fazem "Rocky" (#78), Forrest Gump" (#89) e "Amadeus" (#73) na lista e em particular gostava que me elucidassem alguns critérios, para que me expliquem como por exemplo "Tootsie" - que eu gosto bastante, não é por aí - ou "American Beauty" ou "Jerry Maguire", só para dar alguns exemplos mencionados acima conseguiram melhor colocação que estes dez filmes: "Psycho" (#92), "Being John Malkovich" (#74), "Dog Day Afternoon" (#69), Adaptation" (#77), "Do the Right Thing" (#93), "Memento (#100), "Raging Bull" (#76), "Sideways" (#90), "8 1/2" (#87) e "La Grande Illusion" (#85).

Fico feliz por terem sequer merecido menção ("Vertigo" por exemplo nem essa sorte teve; aliás, os filmes de Hitchcock, uma vez mais, acabaram quase ignorados) ou irritado pelo desrespeito que é serem considerados todos piores que "Tootsie"? Bem, opto por ficar feliz, não por isto, mas porque, ao menos, Paul Haggis ("Crash" e "Million Dollar Baby") não aparece na lista. Ponto a favor: WGA. 

Pág. 1/2